Moon River

E tudo a sua volta parecia sorrir: o casal trocando um olhar doce de cumplicidade na esquina, o homem procurando moradia em um jornal de imóveis, o sol alaranjado tingindo os animados e os inanimados... só ali dentro dela chovia! E gostava da chuva. Não só por sua beleza quando cai do céu imitando cristais (às vezes achava até quase milagre!), mas também pelo cheiro que exala da terra quando encontra o chão: "- Estão fazendo amor!"- sempre pensava. "- A terra e a chuva..." Ah! E também o barulhinho dos pingos que pra ela lembrava o colo de sua mãe... Por isso dentro dela sempre chovia:  era amor e mãe, que são quase o mesmo!

Ela quase sem querer (quase porque nessa vida nunca sentiu-se de fato tão à vontade a ponto disso!) ia atravessar a rua quando seu telefone tocou. E na procura cotidiana o tempo fechou. Sim, o céu se escondeu por detrás de imensa nuvem negra. "- vai chov..." E mal terminou de pensar ouviu um trovão anunciando o porvir... Foi quando viu, do outro lado da rua seu homem/mudo. Ela sempre o via, apressado e calado e por muitas vezes pensou aproximação. Mas sua mudez era quase congênita. Na realidade não sabia se era ela que lhe inspirava a falta de palavras ou se era mesmo assim... quieto. E sempre que o percebia por perto procurava abrigo em sua infantil imaginação. E vinham os padrinhos, as flores, sabia até dos prováveis filhos: Pedro, André e João.  "- Nomes bíblicos, melhor assim!” E a música também! Ela o imaginava cantando, num jeito delicado de quando se dedica uma música a alguém...

- "Achei o celular!" E desabou a chuva! O que era laranja tornou-se cinza, as pessoas corriam procurando um abrigo. Foi quando sentiu um tranco que fez seu telefone cair de suas mãos em  uma poça d'água.

- Desculpe, moça!

Era ele! O homem/mudo.

- A..."

Desconcerto.

- Eu pego pra você, moça! Desculpe-me!

- Ah...

- Moon River!

- Ã...

- O toque do seu celular! "Moon river, wider than a mile I'm crossing you In style someday, laará la lá, lárá, laá, lá...

- …

Pegando-a pela mão correram pra debaixo da marquise. O homem cantarolando... Ela emudecida!

E aos poucos, dentro dela, junto com suas gotas de chuva, um sol imenso surgiu.

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