A pele dela decidiu desta vez

cansou-se de ser decidida
de não responder às melhores coisas
da vida
do seu corpo

as coisas que fogem da razão do outro
e encontram na sua pele um sentido de ser

então ela:

abriu-se em janela
em ar

foi com tudo que ouviu
dançou
voou
beijou

abriu-se em torneira
em água

foi com tudo que lhe molhava
o espírito
a saliva da boca

dançou com os poros que ficaram no ar
voou com os ruídos que o ar deixou
beijou, beijou-se no ar

foi com qualquer sinal que o seu corpo reconhecia
um reconhecimento seu
reconhecido na saliva

Um comentário:

  1. Se engana quem pensa que o coração é o maior orgão do corpo
    E que o senhor de todas as decisões e escolhas fique acima do pescoço
    Se engana quem dá aos pulmões o poder de fomentar caminhos
    Ou escute só fígado para saber quando passou dos limites
    Se engana quem dá aos olhos o volante da vida
    E aos ouvidos toda atenção ao caminhar
    Quem escuta o vento pela boca
    E beija a rua só com os pés
    Não sabe o quanto o estômago e seus ácidos tem a ensinar
    Se engana quem se guia só pelo cheiro
    Quem se sustenta apenas pelas pernas
    E dos dedos o tato deprecia
    Não sabe o quanto o intestino, que só é visto como porta de saída
    As curvas dos caminhos tem a nos mostrar
    Só não se engana quem sabe que a pele é quem sabe
    o atalho, o cheiro e o tato de quem aparece
    o ar, os sons e os ácidos de quem fica
    o beijo, a força e a leveza de quem vai
    Porque a tatuagem das coisas não é o que entra
    e sim o que marca, é tudo o que toca.

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