Esses dias
eu vi uma garça
com uma
plumagem branca
pousada no meio de um rio negro
cheio de
esgoto e doenças
Ela tinha
uma altivez na postura
que
raramente os animais perdem
a não ser depois
de muito maltrato e abandono
no convívio dos homens
no convívio dos homens
estava
sozinha e observava a cidade cinza
um ser tão lindo como esse?
eu quis
gritar para ela: não beba essa água!
fuja daqui, bata as asas e abandone esse lugar
vá para bem
longe de nós pelo amor de Deus!
Mas ela não
me escutava, permanecia ali
parecia
querer participar da nossa desgraça
que miséria de civilização
onde nem as
águas dos rios
estão
livres para ser límpidas
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ResponderExcluirPássaro
ResponderExcluirAquilo que ontem cantava
já não canta.
Morreu de uma flor na boca:
não do espinho na garganta.
Ele amava a água sem sede,
e, em verdade,
tendo asas, fitava o tempo,
livre de necessidade.
Não foi desejo ou imprudência:
não foi nada.
E o dia toca em silêncio
a desventura causada.
Se acaso isso é desventura:
ir-se a vida
sobre uma rosa tão bela,
por uma tênue ferida.
Cecília Meireles